O filósofo grego Heródoto dizia que é necessário pensar o passado para compreender o presente e idealizar o futuro. Em um país onde não se pensa em estabelecer uma política criminal harmônica, pautada nos princípios modernos da teoria da pena, cuja ratio deixou de ser exclusivamente a prevenção e a repressão aos delitos, é imprescindível trazer à memória um dos maiores juristas do Brasil, o Ministro Francisco de Assis Toledo.
A história de Assis Toledo começa na pequena cidade de Congonhal, no interior de Minas Gerais, no dia 8 de Setembro de 1928. Filho de Jerson Toledo e Sílvia Mafalda Bocado Toledo, logo cedo sai de casa rumo a São Paulo, para cursar Direito na Faculdade do Largo São Francisco.
Após concluir a faculdade, Assis Toledo exerceu a Advocacia para, em seguida, ocupar vários cargos de destaque no serviço público estadual e federal, como o de Procurador do antigo IAPI, em São Paulo; de Procurador do INPS, em São Paulo; de Procurador da República em São Paulo, a partir de julho de 1968; de Procurador da República em Brasília, a partir de Fevereiro de 1972; de 4º Subprocurador-Geral da República, por Decreto do Presidente da República de 7/10/1975, tendo sido designado para oficiar perante o Tribunal Federal de Recursos e, mais tarde, perante o Supremo Tribunal Federal, cargo exercido até março/1987; e Procurador-Geral da República substituto, no exercício do cargo em 12/6/1981.
Contando com uma vasta experiência jurídica, além de notório saber jurídico na área criminal, Assis Toledo foi escolhido, no ano de 1981, pelo então Ministro da Justiça Ibrahim Abi-Ackel, para comandar a Reforma do Código Penal pelo Ministro da Justiça, sendo os trabalhos finalizados no ano de 1984, com a aprovação, pelo Congresso Nacional, das Leis 7.209/84 e 7.210/84, respectivamente a nova Parte Geral do Código Penal e a Lei de Execução Penal.
Importante ressaltar o papel visionário e de vanguarda do eminente jurista, sempre atento à relação causa-consequência de uma norma, e que, há quase 40 anos, já atentava para o maior problema de política criminal que o Brasil enfrenta nos dias de hoje, o da superlotação dos presídios.
Escolhas técnicas minuciosamente pensadas pelo Ministro remodelaram completamente o Código Penal, extinguindo-se a medida de segurança para os imputáveis, introduzindo o sistema progressivo de penas e medidas restritivas substitutivas das privativas de liberdade, como uma forma de dar efetividade ao modelo criminal brasileiro. Outra fundamental mudança para o sistema penal foi à inserção de um olhar humanístico ao preso, conferindo-se uma função ressocializadora à pena privativa de liberdade, especialmente mediante o sistema de progressão de regime. Segundo o eminente Ministro, seria fundamental que “o condenado, por seu próprio esforço, mérito e adaptação aos processos de reeducação, possa encurtar o tempo de permanência no regime fechado de cumprimento de pens, no qual a privação de liberdade é total”.
No ano de 1987, diante do brilhante trabalho exercido à frente da Comissão de Reforma do Código Penal, Assis Toledo foi coroado com a nomeação ao Tribunal Federal de Recursos, sendo nomeado Ministro do Superior Tribunal de Justiça em 07 de Abril de 1989, com a extinção do TFR por força da promulgação da Constituição Federal de 1988.
Em 1994, o Ministro escreveu o clássico “Princípios Básicos de Direito Penal”, obra reconhecida pelos principais juristas do Brasil e do exterior como de suma importância para a compreensão do Direito Penal. Assis Toledo, com toda sua genialidade, escreveu de forma simples e clara todos os princípios da nova Parte Geral, trazendo doutrina do direito alienígena para justificar as escolhas legislativas e facilitar a compreensão do Direito Penal.
No dia 15 de Julho de 1996, o Ministro Assis Toledo encerrou sua trajetória na Magistratura ao requerer sua aposentadoria do cargo de Ministro do STJ, tendo sido homenageado pelo sócio fundador do Escritório Eduardo Toledo, seu filho, que sintetizou o perfil julgador do grande jurista, seu pai, na cerimônia de homenagem à aposentadoria, com as seguintes palavras:
Na carta de despedida que endereçou ao Tribunal, o Ministro Assis Toledo, citando conhecida passagem de um filósofo alemão que diz das dificuldades dos juristas que acreditam na sua profissão de intérprete e aplicador da lei, mas, ao mesmo tempo, questiona o direito vigente; pondo-o em dúvida. Fui testemunha ocular desse embate dialético que se estabelecia entre o professor e o juiz que conviviam no interior da mesma pessoa. O primeiro, o professor, pregando a completa reformulação do Direito Penal vigente, O segundo, o Juiz, tendo que aplicá-lo aos casos ocorrentes, sem abandonar os princípios e as ideias que adotou. Tudo isso sob a pressão de um volume de processos a desafiar a presteza e a eficácia da Justiça.
Em 1997 pai e filho se unem e fundam um dos mais respeitados escritórios de Advocacia criminal do país, a Advocacia Assis Toledo & Vilhena Toledo. O eminente Ministro, sem deixar de lado os princípios e ideias que sempre respeitou, trouxe para Advocacia criminal toda sua experiência de Magistrado e Jurista, tendo atuado em casos de grande repercussão por quase 5 anos. Durante esse período, o Ministro Assis Toledo ganhou destaque, ainda, ao atuar como consultor jurídico, com a elaboração de pareceres jurídicos que foram utilizados pelos mais renomados escritórios brasileiros, nos campos penal e processual penal.
Além da Magistratura e da Advocacia criminal, o Ministro Assis Toledo também empreendeu muito na vida catedrática, sendo professor assistente da Faculdade de Direito das FMU, em São Paulo, e tendo, posteriormente, já em Brasília, lecionado na Faculdade de Direito do Uniceub e na Universidade de Brasília, sempre na área do Direito Penal. Não bastasse isso, durante toda sua vida profissional foi convidado para proferir milhares de palestras no Brasil e no exterior.
O grande penalista brasileiro Ministro Assis Toledo faleceu em 28 de Abril de 2001, deixando um legado de vida, de dedicação profissional e, acima de tudo, de honra e dignidade. Sua trajetória e história servem de orgulho e inspiração para seus filhos, netos e familiares. Sua obra jurídica continua atual e permanece como legado de um Direito Penal técnico, adequado aos tempos em que o Brasil vive, com um olhar humano e coerente para o apenado.
Com carinho e admiração seu neto,
Lucas Toledo